Botrytis. Conheça os tão apreciados vinhos feitos com uvas apodrecidas

Botrytis cinerea é um fungo que pode ser muito prejudicial para as uvas ou dar vida a alguns dos vinhos de sobremesa mais apreciados em todo o mundo.
O fungo ataca frutas e vegetais, causando a temida podridão cinzenta – o pesadelo de todo agricultor. No entanto, quando se desenvolve em situações bem específicas, causa a podridão nobre, permitindo aos produtores a criação de vinhos doces de sabor inigualável.
Conheça um pouco mais sobre a Botrytis, as regiões que estão mais propensas a este tipo de fungo e os excepcionais vinhos doces botritizados.
Tenha uma boa leitura!
Condições favoráveis à Botrytis
O fungo da Botrytis costuma aparecer sobretudo em vinhedos próximos a rios e lagos, onde forma-se uma névoa que envolve as vinhas ao amanhecer.
Se a umidade trazida pela névoa permanecer pelo restante do dia, são grandes as chances das uvas sofrerem com a temida podridão cinzenta, correndo o risco de devastar toda a vinha.
No entanto, se a névoa começar a se dissipar, reduzindo a umidade e aparecerem alguns raios de sol à tarde, é então criada as condições perfeitas para o aparecimento da podridão nobre.
Uma vez instalado, o fungo faz microfuros nas bagas causando a evaporação da água e o murchamento das uvas. Desta forma, os açúcares e ácidos se concentram.
Principais regiões produtoras de vinhos botritizados
Como o fungo da Botrytis se desenvolve em condições muito específicas, poucas regiões do mundo conseguem fazer vinhos botritizados.
França e Hungria são os principais países produtores.
A cerca de 40 km a sudeste de Bordeaux, na França, é produzido o vinho botritizado mais famoso entre os apreciadores do estilo, o Sauternes, feito com as uvas Semillon, Sauvignon Blanc e Muscadelle.
Uma das famílias mais tradicionais de Bordeaux, a Rothschild, cuja história começa em 1853, quando o Barão Nathaniel de Rothschild comprou uma propriedade e a chamou de Château Mouton Rothschild, produz um dos mais finos Sauternes que chegam ao Brasil.
Baronne Pauline Sauternes é um vinho branco de sobremesa com grande complexidade e elegância. Possui excelente frescor e equilíbrio entre acidez e doçura residual, com final de boca frutado e agradável. Os aromas deste Sauternes lembram maçãs, mel e damascos, como toques resinosos e cítricos.
Além do Sauternes, na França são feitos outros vinhos botritizados, menos famosos, mas tão agradáveis quanto. Barsac, Monbazillac, Alsácia e Vale do Loire são algumas dessas regiões que propiciam o surgimento do fungo da Botrytis.
Outro vinho botritizado extremamente famoso é o Tokaji, produzido na Hungria.
Tokaji é feito na comuna que tem o nome parecido com o do vinho, Tokaj, sem a letra “i” – com o uso das uvas Furmint, e das menos conhecidas Hárslevelü, Kabar, Kövérszölö, Zéta e Sárgamuskotály.
O vinho doce de Tokaji pode ser produzido em diversos estilos, mas o mais conhecido é o Tokaji Aszú, que deve ter no mínimo 120 gramas de açúcar por litro.
Feito com as uvas Furmint, Hárslevelü e Kabar, Sauska Tokaji Aszú é uma obra prima dos vinhos de sobremesa. Dominado pelo frescor e presença de frutos secos, é rico em sabores que lembram damascos e casca de laranja. O vinho é fermentado em barricas e envelhecido em carvalho novo por 20 meses.
Além de França e Hungria, a Alemanha também produz excelentes vinhos afetados pela podridão nobre, principalmente na região de Mosel.
Austrália, Nova Zelândia, Estados Unidos (Califórnia) e África do Sul também produzem seus vinhos botritizados há décadas.
Por que os vinhos botritizados são mais difíceis de encontrar?
Primeiro porque as zonas produtoras são limitadas, devido às condições muito específicas para o surgimento do fungo da Botrytis.
Segundo que a colheita não é realizada de uma só vez. As uvas afetadas pelo fungo apodrecem aos poucos, sendo necessárias diversas colheitas até extrair todas as bagas de um único cacho. A conclusão do trabalho de colheita pode levar até três meses.
Outro motivo, é que existe uma perda considerável de água nas uvas botritizadas, diminuindo consideravelmente o rendimento. Em alguns casos, para produzir uma taça de vinho botritizado é necessário cachos de uma videira inteira.
Por todos esses motivos, os vinhos botritizados são produzidos em menor quantidade e, consequentemente, atingem preços mais altos do que os demais vinhos.
No Brasil, as poucas opções de vinhos botritizados geralmente vêm de Sauternes e Tokaji. Regiões menos conhecidas e pequenos produtores dificilmente chegam ao nosso país.
Curiosidades sobre vinhos botritizados
A Botrytis é um fungo do tipo Ascomycota, o mesmo tipo de fungo utilizado na produção da penicilina e de queijos azuis, como o Stilton.
Nos vinhos botritizados é comum a presença de um tipo de ácido que normalmente não é encontrado nos demais vinhos, o ácido glucônico, que é originado pela ação do fungo da Botrytis.
Não é toda e qualquer variedade de uva adequada para fazer vinhos botritizados. Normalmente são uvas brancas de cascas mais finas (que facilitam a perfuração pelo fungo) e cachos um pouco mais apertados.
O vinho Tokaji é tão importante para a cultura húngara, que é mencionado no hino nacional do país.
Sugestões de harmonização com vinhos botritizados
A sugestão é que o vinho seja combinado com comidas igualmente doces.
Sobremesas frutadas, bolos de chocolate, torta holandesa, crumble de ruibarbo, sorvetes, mousses, entre outros pratos doces.
Outra opção seria um queijo azul. O sabor pronunciado deste queijo irá equilibrar a riqueza e o frescor de um vinho botritizado.
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Referências:
* Le secret des Sauternes
https://www.bordeaux.com/fr/Bordeaux-Magazine/Journal/Education/Le-secret-des-Sauternes
* Botrytis Cinerea: The Noble Rot
https://www.vinoble.org/en/blog/botrytis-cinerea-noble-rot
* Understanding Tokaj
https://tastehungary.com/journal/understanding-tokaj/
* Vinhos Botritizados
https://www.enocultura.com.br/vinhos-botritizados/